segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Onde foi que perdemos a mão?

Onde foi que perdemos a mão?
 
 
   Notícias de crimes praticados por adolescentes criados com os melhores recursos e intenções tiram o sono de pais e educadores. Por quê? Onde foi que erramos?
   Sem menosprezar as condições sociais que colaboram para o fenômeno, vamos concentrar nossa análise aos comportamentos que, dentro da família, colaboram para a banalização da agressividade e da transgressão.
   1. A pedagogia do tapa é amplamente utilizada: recorre-se à força física para punir ou coagir - nem que seja "aquele tapinha bem dado, que vale mais do que mil palavras". Independentemente da intensidade, um adulto que dá um tapa numa criança ensina que a violência é uma forma legítima de  resolver um problema.
   2. Os pais lidam com os filhos agressivos de maneira ambígua, confundindo violência com capacidade de liderança: a criança rebelde "sabe o que quer", "tem personalidade". Essa atitude reflete admiração (até certa dose de inveja) por esse filho brigão, que não se deixa dominar.
   3. Os valores morais são abstratos, mas sua transmissão se dá na concretude da convivência cotidiana, por meio da assimilação de gestos e atitudes. E aí os jovens convivem com atitudes que desmentem nossos prolíxos sermões sobre a importância da disciplina e do respeito pelo próximo, como brincadeiras sarcásticas e transgressões (os pais passam pelo acostamento quando a estrada está congestionada, param em fila dupla na frente da escola, desrespeitam a faixa de pedestres: professores utilizam vídeos e discos pirateados).
   4. Os pais (e as mães!) lidam com as frustrações dos filhos como se fossem erros ou desvios de rota, e não parte do desenvolvimento. Essa postura faz com que as crianças tenham baixa tolerância à não-satisfação imediata dos desejos.
   1. Os videogames fazem a criança esquecer que, num jogo, é fundamental levar em conta os sentimentos de todos os envolvidos; quando alguns se divertem enquanto outros estão assustados ou constrangidos, saímos do domínio do lúdico para entrar no universo da violência.
   2. Frases do tipo: "Aproveite a vida agora, porque depois..."; "Esses são os melhores anos de sua vida!"; "Se eu tivesse a sua idade..." sabotam os programas de prevenção, seja, do uso de drogas, sejam de doenças sexualmente transmissíveis. Por que o jovem renunciaria a um prazer imediato para chegar saudável a um futuro sem atrativos?
   Transmitimos reiteradamente aos nossos jovens a mensagem de que não vale a pena ingressar no mundo adulto, feito apenas de obrigações e encargos; o trabalho é apresentado como um fardo intolerável, a relação conjugal é ridicularizada por ser enfadonha, os filhos parecem representar apenas um fator de desgaste. Diante da figura acabrunhada do pai que volta do trabalho, diante dos resmungos da mãe que se queixas da injustiça de sua jornada dupla, como esperar que o adolescente respeite os critérios de escolha desses adultos infelizes?
   No entanto, essa imagem é mentirosa. O trabalho não é  só um fardo, é também um espaço de desafios e descobertas, de satisfação e realização pessoal; a experiência da maternidade e da paternidade traz um sopro renovador para a vida do casal; o vínculo conjugal não é necessariamente um grilhão que tolhe a liberdade e impede o vôo; é muitas vezes o porto seguro onde as energias são carregadas para que o vôo se faça com maior segurança.
   De onde vem nosso pudor de reafirmar nossas escolhas e confessar nosso compromisso com a ternura? Se fôssemos menos hipócritas, poderíamos olhar mais de perto para o que caracteriza a cultura jovem. Talvez, então, oferecêssemos canais mais adequados para a elaboração da rebeldia dos adolescentes.
 
                                     Lidia R. Aratangy, terapeuta de casais, escritora, autora de Tesouros da Juventude, entre outros livros. (Texto retirado da Revista VIVER, Ano VIII, setembro de 2000,  nº 92. pág. 33)

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Lana M.